Acho que esse é o tipo de coisa que
não percebes. É como quando estás a crescer e de repente já não queres brincar
com bonecas ou carrinhos. É tão gradual que de repente paras e pensas sobre
isso.
Quando era mais nova sentia sempre
que não tinha “nada”. Quando digo nada, refiro-me a alguma coisa a que fosse excecionalmente
boa. Ao contrário do que as pessoas possam pensar eu não a melhor a escrever,
não era a melhor a fazer contas, não era a melhor a desenhar, nem a melhor a
desporto. Devem ter sido muitoooo poucos os professores que olharam para mim e
pensaram “esta pode saber fazer qualquer coisa bem”. Vamos ser bem realistas e
admitir que os professores têm sempre uns três queridinhos e são esses que vão
ser médicos, presidentes e salvar o planeta de um cometa. Os outros são os
tipos que tiram macacos do nariz e fazem barulho. Eu fazia barulho, tirar
macacos do nariz sempre foi nojento para mim.
O que quero dizer é que não fossem
em casa a minha mãe dizer-me, “uau que desenho bonito” ou “uau tens mesmo jeito
para ler em voz alta” ou “ caramba tens cá uma imaginação”, eu provavelmente
nem teria tentado escrever.
Quando comecei a escrever era
péssima, dava muitos erros, e o enredo estava todo confuso, mas eu tinha a
certeza de que gostava muito de escrever. Dava-me uma ferramenta para me
esquecer do que se passava à minha volta e permitia-me ter controlo de um mundo
que eu criei.
Lembro-me que quando cheguei com o
livro a um milhão de leituras pensei que estava tudo feito.
Deve ter sido assim
até ao final do secundário. Este ano, quando precisei de escrever uma
reportagem e uma entrevista senti que todos aqueles anos de treino, tinham
finalmente dado frutos. A minha
professora não me disse que eu escrevia muito bem, pelo menos a entrevista onde
não tens muito por onde dar asas à imaginação, mas na reportagem? Senti que
queria fazer aquilo vezes e vezes sem conta. Eu não quero escrever só
histórias, quero escrever qualquer coisa que os outros gostem de ler.
Adoro
escrever sobre coisas aleatórias, adoro escrever qualquer coisa que me deixe os
sentimentos à flor da pele.
Eu sempre tive medo de não
encontrar o meu caminho, ou pelo menos algo que gostasse de fazer e sinto que
encontrei. Não é a minha única paixão, gostava de aperfeiçoar os meus desenhos,
gostava de ser ilustradora, é todo um mundo de coisas que gostava de fazer. No
entanto escrever deve ser uma das coisas que mais preenche e de certa forma,
mesmo que eu não ganhe a minha vida com isso, saber que encontrei aquilo que
amo dá-me uma grande paz de espirito.
Senão fosse pelos meus pais não sei se
alguma vez teria chegado à conclusão de que sou uma pessoa que gosta de
escrever, ler e desenhar, por isso se tivesse que dar um conselho à Sara que
vai ser mãe daqui a uns anos é “por favor não te esqueças de os incentivar a desenhar,
a ler e a escrever, a cair de joelhos no chão e a levantarem-se”. Acho que hoje
em dia os pais estão tão presos à escola e às boas notas que acabam por
projetar as frustrações nos filhos. Eu não quero isso. A minha educação foi tão
rica em livros que provavelmente a minha imaginação ficou do tamanho de um
elefante, e é esse tipo de coisa que eu desejo ao mundo. Sonhar e imaginar,
colocar isso no papel, seja de que forma for dá uma sensação de preenchimento fantástica.
Escrever não nasce connosco,
escrever aprende-se, treina-se a aperfeiçoa-se, se é isso que alguém quer fazer
não desista à primeira, nem à décima. Melhor. Não desista nunca.