Um filme que mistura a realidade e a ficção no sentido mais
bonito da palavra. Nunca o termo “California Dreamin” me pareceu tão efémero e verídico
ao mesmo tempo. Se o curso da história tivesse uma segunda opção, eu gostava que
fosse esta.
Custa-me um bocado falar deste filme, visto que há quase uma
religião dedicada a Tarantino.
É que eu, em toda a minha ignorância sabia quem ele era, mas
nunca tinha posto os olhos num filme seu. E não sei se isso é bom, ou mau,
porque depois de ver “Era uma vez em Hollywood” vou viver descansada, de que
foi tudo aquilo de que o meu espirito precisava para ser apaziguado.
Dois dias antes de ir ao cinema vê-lo com uma verdadeira
perita no assunto, tinha tido a seguinte reflexão enquanto lavava os dentes:
Porque é que nunca
vemos filmes ou séries que não dependem de um clímax? Somos sempre apanhados
por um murro no estômago, um nó na garganta, e um bater de pé ansioso. Constantemente
à espera que os bons vençam os maus? Onde é que está uma história pelo mero
prazer da realidade? Onde não se passa nada, mas da forma mais realista possível?
As pessoas têm esta tendência a achar que as suas vidas são uma seca pegada,
porque a vivem, mas a verdade é que vivemos recheados de surpresas, muitas
vezes não temos é olhos, nem coração para as perceber. Aquilo que mais me
chateia num filme é não poder ver o “depois” do final. Eu quero aquele pedaço
de narrativa que vive na ideia do roteirista.
“Era uma vez em Hollywood” é a Califórnia rotineira de 1969.
São atores, duplos e realizadores no seu pequeno mundo normal, a andarem para cá
e para lá em carros extravagantes. É Sharon Tate a carregar a sua pequena Chanel
até ao cinema, enquanto, como qualquer jovem atriz, tenta perceber que impacto
tem o seu trabalho nos outros.
Por nenhum momento há a inveja daquilo que possuem, mas sim
daquilo que lhes passa à frente dos olhos.
O filme, que fala do ator Rick Dalton (Leonardo
DiCaprio) e do seu duplo, Cliff Booth (Brad Pitt) dá-nos um olhar intimista
sobre aquilo que é realmente ser-se um ator. Geralmente, quando vemos um filme
pensamos sobre o personagem, mas se repetirmos a dose começamos a ver o
ator, e isso é místico, olhar-lhe para a pessoa e não para a personagem. Muitos
dos filmes que se propõem a estudar a vida de atores funcionam como biografias. Em "Era uma vez em Hollywood” o “ser-se” ator torna-se palpável. Para alguém como
eu, que pouco sabe de cinema, mas que, como espetadora é amante das histórias,
o filme é uma verdadeira aragem fresca, numa tarde sufocante de verão.
Um filme sem filtros, que não se preocupa com as palavras que
usa, nem com aquilo que retrata. Fez-me voltar quinze anos atrás, quando me
sentava no chão da carpete a brincar e ia espreitando os filmes de cowboy que o
meu pai via, e que pareciam não ter fim.
Um detalhe excecional do filme, e que torna tudo, no sentido
mais completo da palavra, melhor, é a música. Especialmente a cena onde toca “California
Dreamin”.