Não me
lembro, se alguma vez um livro operou em mim uma mudança tão dramática. Um
crescimento de personalidade tão brusco, num curto espaço de tempo.
“Lá onde o vento chora”, de Delia Owns, transporta-nos a uma
América do século passado, pautada pelo preconceito.
Livro: Lá onde o vento chora
Autora:Delia Owns
Preço: 16.92 € (na wook)
Páginas: 392ISBN: 978-972-0-03220-1
Quando Chase é morto na pequena cidade de Barkley Cove,
todos os olhos se viram para a miúda que vive sozinha, desde pequena no
pantanal.
Kya, têm seis anos quando é,
lentamente abandonada por todos à sua volta. É reflexo de uma família disfuncional,
onde a mãe é a primeira a partir.
Li algures, que este era um livro lento, e de facto é. No
entanto, não fosse essa lentidão, como poderíamos nós acompanhar mais de quinze
anos de crescimento pessoal? A magia que se opera diante dos nossos olhos é
assombrosa. É um livro, sinceramente tão bem escrito, como imaginado, dividido
em dois tempos; capítulos sobre a vida de Kya, e capítulos dedicados à
investigação do homicídio de Chase.
A narrativa
engole-nos e faz-nos escorregar pelo crescimento de Kya, dos anos mais tenros,
à mulher que se torna.
A inteligência, paciência, resiliência e bondade com se
conecta à natureza são um reflexo da forma como consegue transformar na nossa imaginação, um sitio moribundo,
como um pantanal, num jardim de Éden.
A sua fome, tão literal como metafórica pelos outros, é um eco
da humanidade primitiva que ainda vive dentro de todos nós. Há um momento, em
particular, depois de o pai a abandonar, em que Tate, um velho amigo de um dos
irmãos, a chama pelo nome, e ela se torna quase transcendente a tudo. As letras
que compõe o nome dela, ditas por outra voz, são a confirmação de que ela ainda
existe.
O crescimento de uma personagem nunca foi tão detalhado, e é
nos momentos de viragem, em que a sua natureza selvagem ganha peso, que o seu
comportamento espelhado na natureza se sobressaí. Esses foram os meus momentos
favoritos do livro.
E por fim o homicídio, o mistério
que alimenta a nossa curiosidade. Nem isso pecou. Havia duas saídas até à
ultima página: ou vivíamos na ignorância como todos, ou o mistério nos era
revelado, no ultimo paragrafo.
E é engraçado, como a resposta esteve sempre lá,
na obsessão natural de Kya, para observar as diferentes famílias presentes no
reino animal.
Este livro alterou o meu ponto de vista em relação a várias
coisas, mas sobretudo, contra o preconceito. Mais vale falar, do que morrer
engasgada.
E por fim, para quem quer ler o livro, deixo uma pista:
Kya velejou, erguida e mais tarde protegida pelo vento.