O meu primeiro trabalho...bob a lojista
outubro 26, 2018
Falar do primeiro trabalho é mais ou menos como quando a
Anastasia fala da primeira vez com o Christian Chicotada Grey...”não sei
bem...havia um quarto onde se esquartejavam pessoas” com o trabalho é o mesmo,
“não sei bem...ganhei dinheiro que não me foi dado pelos meus avós”.
Quando fui fazer a entrevista estava super nervosa, mas
felizmente não me fizeram a tão temida pergunta “o que é que conhece da nossa
empresa?” ...não, em vez disso pediram-me para falar de mim, o que de certa
forma ainda conseguiu ser pior. Ainda me recordo com alguma exatidão do que
disse, mas é tão pobre em adjetivos que nem tenho como o expressar.
Acabei por ficar, mesmo sem experiencia. Mais tarde
disseram-me que fui uma ótima escolha já que ninguém ia aceitar as condições.
Assinei para dois meses, para mim foi excelente, um trabalho de verão com o
extra de não precisar de uma carta de demissão quando a escola e o trabalho se
tornassem demasiado para o meu pequeno corpinho (FAÇO VÉNIAS A TRABALHADORES
ESTUDANTES).
A primeira semana foi estranha, porque querendo ou não há
ali uma dinâmica, eramos seis mulheres (a sexta roda era eu) e tive que me
adaptar e claro que no primeiro dia (e semana) tu ficas ali, meio à espera que
te digam o que deves fazer.
Se há algo que agradeço é pela equipa que me calhou, todas
mulheres, super queridas, simpáticas e profissionais.
Menciono isto da equipa porque se o ambiente fosse horrível
a coisa tinha dado muito para o torto. Primeiro porque o meu contrato era um
full-time disfarçado de part-time, fiz dias seguidos oito horas e conto pelos
dedos das mãos os dias em que fiz o meu horário normal. Eu estava a tapar
buracos e digo já que tapei os buracos o melhor que pude.
Falando do trabalho em si: Loja de crianças, assistente de
vendas. Eu sempre achei que gostava de crianças, até que elas olham para ti
como se possuíssem o teu rabiosque. Mas pior que as crianças só uma coisa: OS
PAIS.
Digo sinceramente que em dois meses cresci mais
emocionalmente do que em dois anos, e que desenvolvi uma capacidade de lidar
com pessoas mal-educadas tão grande que sinto que sou capaz de fazer frente a
qualquer quarentona que ache que pode trocar um 14 anos por outro 14 anos com o
talão fora de validade!
Se me perguntassem “tens alguma cena com clientes que nunca
te vais esquecer?” sim tenho, uma cliente foi agressiva comigo, atirou-me o
terminal do multibanco para o balcão e começou a gritar comigo porque em plena
liquidação de loja eu não podia fazer embrulhos. Ela foi mal-educada, agressiva
e ainda insultou a minha posição ali “como se não fosses paga para isso”. Não,
não sou quando o meu patrão me diz que não o posso fazer.
Tive muitos dias em que só me apetecia abanar alguém, as
pessoas metem-se no teu trabalho, acham que tem o direito de opinar sobre ti e
o que estás a fazer, e melhor que isso tudo. Acham que és deles. Eles realmente
acham que há ali uma relação escravo/senhor. Tive um miúdo que cuspia
sistematicamente para o balcão até que eu lhe disse que ia chamar o segurança.
Quando ele saiu eu fui limpar o balcão porque uns dias antes a minha colega se
tinha sentido enojada com a situação e não o queria fazer de novo. Enquanto eu
estava ali a dizer que aquilo era pura e simplesmente falta de civilização uma
mãe muito ofendida que apareceu sabe-se lá de onde diz-me “vocês não sabem o
que custa educar uma criança”. Nesse momento eu só queria dizer-lhe que tinha
um filho, mas em vez disso dei-lhe com a verdade na cara o que foi muito mais
prazeroso. A mulher começa a gaguejar e a justificar-se “ah mas a mãe não viu?”
como se a mãe não ver justificasse. Eu digo-lhe que sim, que a mãe viu e no
final ela tem a gentileza de pedir desculpa.
Este tipo de situações, tal como atirarem a roupa para cima
de ti, ou pedirem-te para desfazeres caixas que ainda não estão em inventário,
de te perseguirem na loja porque não tens nada que gostem e têm “certeza
absoluta que tem alguma coisa lá dentro” é o cumulo.
Com esta experiência aprendi que os lojistas são os
super-heróis do mundo real.
O que conto aqui é tudo verdade, e se me perguntarem se
estou arrependida digo-vos que não. Não. Não porque cresci imenso. Não, porque
jantei em cima de um escadote comida aquecida num micro-ondas meio chanfrado a
ver Friends. Não porque adorei
conhecer todas as minhas colegas. Não porque quando passo em frente à loja que
agora fechou tenho saudades das pessoas com quem trabalhei. Ganhei um carinho
muito grande a toda experiencia porque me deu muitas lições e me ensinou a
valorizar mais tudo no geral. Não, porque quando estava sozinha na loja ouvia
Shawn e Selena como se estivesse num videoclip. Não porque me ria ás
gargalhadas com as coisas mais insólitas. Não porque tive que dar mil passos
para fora da minha zona de conforto, e isso fez-me bem mesmo quando eu achava
que me fazia mal.
E no final de tudo ganhei o meu primeiro dinheiro sozinha!
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